Cuidados sanitários pós-desastres

Cuidados sanitários pós-desastres 3
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O que podemos fazer para evitar epidemias em abrigos com milhares de animais?

Atualmente aproximadamente 19 mil animais estão abrigados em 346 abrigos no Rio Grande do Sul. Muitos desses abrigos foram montados de forma emergencial após as graves inundações ocorridas no mês passado. Alguns abrigos possuem mais de 2 mil animais, na maioria cães.

Sabemos que durante um desastre de grande magnitude, como foi esse, uma enorme quantidade de animais de diferentes espécies pode ficar desalojada e desabrigada. Invariavelmente após o resgate necessitam ir para um local seguro até serem realocadas em segurança para uma nova casa ou para seu antigo tutor.

Abrigos

Abrigo Animais

Esses locais, conhecidos como abrigos emergenciais devem ser projetados e manejados para atender as necessidades dos animais: Garantir sua saúde, seu bem-estar e a saúde de todos durante o tempo necessário. 

Contudo, sempre que temos uma grande quantidade de animais de diferentes origens albergadas em condições como essa, os desafios sanitários são imensos. O risco de disseminação de doenças infecto contagiosas aumenta vertiginosamente e os riscos para animais contactantes e pessoas também.

Diversas medidas devem ser implantadas em desastres para reduzir esses riscos e prevenir problemas maiores, desde:

  • Escolha adequada do local do abrigo – abrigo com pé direito alto, iluminado, com boa ventilação, com piso de fácil limpeza e desinfecção.
  • Tamanho adequado do abrigo – evitando ao máximo altas densidades, ou seja, ter espaço suficiente para albergar o < numero de cães e gatos/m2 possível
  • Equipe treinada e seguindo um sistema de comando de incidentes (SCI)
  • Todos os animais receberem vacinas éticas logo na admissão do abrigo. Vacina espécie-específica para caes e hatos  (V8 ou V10 caes e V3 ou V4 gatos) + antirrábica. Portanto, a única exceção para que um animal não receba essa vacinação na entrada do abrigo, é para animais gravemente feridos ou doentes.
  • Todos os animais devem receber medicamentos antiparasitários (preferencialmente, spot on) para endoparasitas (contra vermes intestinais) e ectoparasitas (contra pulgas e carrapatos)
  • Todos os animais devem ser triados para as principais doenças transmissíveis passiveis de serem identificadas com exames clínicos ou laboratoriais. Ou seja, FIV, FELV para gatos, Cinomose e Parvovirose – cães, Esporotricose – cães e gatos.

Como previnir?

Uma medida considerada essencial para a prevenção e mitigação dos riscos da disseminação de doenças infecciosas, é implantar uma triagem efetiva. O envio dos animais para uma área de quarentena. Para a observação inicial, a separação dos animais suspeitos/confirmados em áreas de isolamento para o adequado tratamento das principais doença infecciosas.

Quanto antes for identificado que o animai apresenta a doença, quanto antes ele for isolado e tratado, menor será a chance dessa doença se espalhar dentro do abrigo.

Contudo, para essa detecção precoce e para esse isolamento acontecer de forma efetiva, precisamos de equipes veterinárias bem treinadas. É necessário também exames laboratoriais de qualidade para uma triagem e para a confirmação das infecções, e áreas de quarentena e isolamento adequadas e suficientes.

Quais os próximos passos?

Sabemos durante esses desastres, é um grande desafio dentro da medicina de abrigos (shelter medicine). Como conseguimos triar, “quarentenar” e isolar os animais para trata-los de forma adequada, num ambiente com milhares de animais?

Para combatermos esses desafios precisamos de muito recursos – humanos, financeiros e tecnológicos. Precisamos de áreas adequadas e distantes, para instalar a quarentena e o isolamento.

É necessário também o apoio das instituições, da academia, do governo. Precisamos de um grande contingente de pessoas, médicos veterinários e voluntários.  Precisamos de especialistas nas áreas de medicina veterinária de abrigo coordenando. Orientando e treinando as equipes a seguires os POPs, (procedimentos operacionais padrão) necessários para que se mantenha uma ordem e um manejo sanitário adequado.

Um perigo a saúde pública

Além das questões sanitárias dentro dos abrigos nos desastres, ainda existe o enorme risco de transmissão de doenças por vetores e por água e solo contaminado, ou seja, o risco ambiental.

Milhares de cadáveres de animais encontram-se ainda presos em casas ou misturados na lama contaminada. Com as inundações, aumenta-se o número de vetores aéreos (mosquitos, pernilongos, etc.) que podem transmitir doenças graves, como leishmaniose e dirofilariose. Além disso, aumentam as chances de infecção por Leptospira sp, que causa leptospirose em pessoas e animais. Já em solo, dentro dos abrigos lotados de cães e gatos, podemos ter um aumento da infestação por pulgas e carrapatos, que podem transmitir doenças hematológicas e parasitas. Ademais, há o aumento do número de animais sinantrópicos, como ratos, que podem carrear agentes infecciosos, como a própria Leptospira.

Devemos ter em mente que, além dos riscos sanitários que se exacerbam numa condição como essa, a saúde mental e o bem-estar dos animais e pessoas também ficam comprometidos.

Muitos cães, após o trauma de perder suas referências, sua casa e seus tutores, somados ao fato de estarem confinados, ou seja, presos em baias pequenas ou em correntes, em um ambiente com milhares de cães latindo, podem ficar bem estressados e agressivos. Logo, isso traz um risco maior de mordeduras a outros animais, aos veterinários e aos voluntários.

A preparação e segurança para veterinários e voluntários é indispensável

Voluntários

Todos os veterinários e voluntários devem estar vacinados contra a raiva. Devem receber treinamento para um adequado manejo etológico, para se evitar mordeduras, ataques e acidentes com cães e gatos. Também devem receber treinamento e estarem usando EPIs como luvas, botas, jalecos, mascaras, óculos etc.

Portanto, em desastres todos esses aspectos de segurança individual, imunização prévia, manejo etológico, etc, devem ser cuidadosamente pensados pelos líderes de equipes. Além disso, os líderes devem ter conhecimento técnico nas questões relacionadas à medicina de abrigos, ao manejo de abrigos pós-desastres, aos riscos sanitários relacionados ao tipo de evento e, principalmente, aos aspectos de saúde e bem-estar de todos, de animais e pessoas.

Em suma, não é um trabalho fácil. Além do mais, não é um trabalho a curto prazo; é um trabalho árduo que exige inteligência emocional de todos. No entanto, é um trabalho recompensador. Afinal, os animais afetados por essa tragédia precisam de nós. Eles são os mais vulneráveis em um desastre e, portanto, necessitam de todo nosso empenho e cuidado, que deve ser feito de maneira responsável e permanente.

Por M.V. MSc. Rosangela Gebara | Diretora Técnica AMPARA ANIMAL

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